O papel da Umbanda na sociedade brasileira

A Umbanda é uma religião brasileira que surgiu no início do século XX, resultado da fusão de diversas tradições religiosas, como o Catolicismo, Espiritismo e religiões africanas. Ela se caracteriza pela crença em uma entidade divina suprema, Olorum, e na existência de espíritos que atuam como intermediários entre o mundo espiritual e o mundo material.

A Umbanda é uma religião que se enraizou profundamente na cultura brasileira e possui uma grande influência na sociedade. Seus cultos, cerimônias e rituais são realizados em terreiros, que podem ser encontrados em diversas regiões do país, principalmente nas regiões sudeste e nordeste.

Um dos principais papéis da Umbanda na sociedade é o de promover a inclusão social. Ela acolhe pessoas de todas as raças, classes sociais e orientações sexuais, sem preconceitos ou discriminações. Além disso, a Umbanda tem um papel importante na ajuda aos mais necessitados, realizando ações solidárias como doação de alimentos, roupas e outros itens.

Outro papel importante da Umbanda na sociedade é o de preservação da cultura afro-brasileira. A religião é uma forma de manter viva as tradições e rituais dos povos africanos, que foram trazidos ao Brasil durante o período da escravidão.

A Umbanda também tem um papel importante na promoção da paz e da harmonia entre as pessoas. Ela ensina valores como o respeito, a tolerância e a compaixão, que são essenciais para uma convivência saudável e pacífica.

No entanto, a Umbanda ainda enfrenta preconceitos e estereótipos em nossa sociedade. Muitas pessoas ainda a veem como uma religião inferior, associada a práticas obscuras e malignas. Esses estereótipos são frutos da falta de conhecimento e da intolerância religiosa que ainda existem em nosso país.

Por isso, é fundamental que se promova o diálogo e o respeito entre as diversas religiões presentes em nossa sociedade, para que todas possam ser compreendidas e respeitadas em sua diversidade. A Umbanda tem um papel importante nesse processo, ao mostrar que é possível viver em harmonia, respeitando as diferenças e cultivando a paz e a solidariedade.

Umbanda: a longa resistência do sagrado brasileiro

Por Fran Alavina

Por ocasião do dia nacional da Umbanda, em 15 de Novembro

Quem quiser contar a história do Brasil quer pela vias da mestiçagem, quer pelas vielas da exclusão não poderá fazê-lo sem passar pela constituição da Umbanda, pois sua compreensão não se dá como simples história da religião. Diferente de outros credos, não adentramos bem na Umbanda perguntando “qual Deus professa essa religião?”, mas sim: “Quem são esses que a praticam, quem são os espíritos que nela se manifestam?”

De fato, não obstante suas contradições, a Umbanda se assume como religião nacional, como modo de fazer sagrado tipicamente brasileiro. Contudo, ante o atual cenário questionamos: como uma religião que se orgulha de sua brasilidade é alvo, cada vez com maior truculência, da intolerância e da barbárie fundamentalista? Em outros termos: Qual Brasil se persegue quando se persegue a Umbanda e outras religiões afro-brasileiras?

Para esta resposta não caberia aqui o adágio segundo o qual, “o Brasil não conhece o Brasil”, se tal vale para outras realidades, não se trata da mesma coisas no caso das perseguições sofridas pelos umbandistas. Mesmo existindo muito desconhecimento e mistificação massiva sobre a Umbanda como religião, ou seja, ignorância travestida de senso-comum; na maioria dos casos, aqueles que perseguem a Umbanda sabem muito bem qual o seu alvo. Não se trata de perseguir apenas uma religião, mas também aquilo que de uma realidade fragmentada e excluída, ela repõe no plano simbólico do sagrado: perfazendo certa integralidade que o real ainda não é capaz de oferecer.

Com efeito, a Umbanda repõe no seu interior e dá visibilidade àqueles que foram por séculos apagados, extirpados da história oficial como “resíduos” de um certo Brasil oficial que enxerga a si mesmo de modo míope e intencionalmente obtuso: são os povos originários que desçam aos terreiros como espíritos de caboclos das mais diferentes nações; negros escravizados na figura popular das pretas e pretos-velhos, homens e mulheres que dão vida a uma sabedoria resistente capaz de ultrapassar as marcas do tempo e dos açoites; os malandros que sempre nos lembram que a vida não é ditada por um tempo único. Ou seja, tipos que um certo discurso de brasilidade oficial busca extirpar como escombros exóticos que não possuem lugar em uma ideia de nação que quer se projetar como naturalmente boa.

Ademais, sendo uma religião do transe, a capa do exotismo, causadora de estranhamento, é dada a Umbanda como se fosse algo natural. Pelas lentes do exótico, ela deve ser necessariamente considerada menor, deslegitimada em sua dignidade de sagrado, depois de feito isso, associá-la como sendo intrinsecamente má é um passo que já foi dado há muito tempo nas avenidas da intolerância.

Assim, não temos um “Brasil que não conhece o Brasil”, mas sim “um Brasil que nega o Brasil”. Isto é, em torno da perseguição à Umbanda também está em questão o problema nacional e o modo como a cultura brasileira se pensa: se é capaz de elaborar para si mesma uma imagem mais fiel de sua realidade, reconhecendo suas contradições, ou se assume completa e cinicamente um ponto de vista que “varre para debaixo do tapete” tudo aquilo que considera exótico, portanto indesejável.

Nesse sentido, contra a Umbanda preponderou uma serie de preconceitos que com o passar do tempo foram naturalizados como questões aparentemente óbvias que não precisariam ser discutidas. Se até a década de ’80 ainda era possível uma certa maleabilidade e aceitação da cultura umbandista como expressão legítima da cultura nacional – recordemos fenômenos como o exu seu Sete o Rei da Lira, que incorporado ao vivo no programa do Chacrinha comandou uma gira televisionada; a expressão artística de Clara Nunes tanto no seu gestual, quanto nas músicas que a mineira ajudou a perpetuar, ou na prática popular de que não haveria contradição em ir à missa no domingo e durante a semana tomar um passe com o preto velho – hoje tudo isto parece distante. Um país que migrou pouco a pouco de si mesmo.

Em outras palavras, uma certa ideia de nação e de brasilidade expressa na Umbanda foi sendo abandonada até chegar ao limite da execração e da busca de seu aniquilamento. Desse modo, saiu-se dos discursos que lhe negavam legitimidade religiosa – alocando a Umbanda na teia generalista do folclórico – até o topo da guerra de fé que hoje ela enfrenta.

Recordar mais um dia nacional da Umbanda é afirmar que existe vividamente uma fé constituída como brasilidade, sagrado que se mantém firme apesar das rasteiras da intolerância. Não apenas como expressão daquilo que o país foi e é em suas mais determinantes contradições. Na Umbanda também repousa um desejo ainda não alcançado: toda gira não é apenas um ato de fé, é uma alternativa à história oficial, é um desejo de nação dramaticamente atual.

Fonte: Outras Palavras

Entenda por que as comemorações de Iemanjá e Nossa Senhora da Assunção ocorrem no mesmo dia

Em 15 de agosto, comemora-se o Dia de Nossa Senhora de Assunção, padroeira da Fortaleza e figura importante para a tradição religiosa cearense. Na mesma data, a umbanda celebra a Festa de Iemanjá, a mãe de todos os Orixás. A coincidência entre as festividades, no entanto, tem uma explicação. De acordo com o antropólogo e pesquisador do Laboratório de Antropologia e Imagem da Universidade Federal do Ceará (UFC), Jean dos Anjos, as tradições de Festa de Iemanjá no Brasil são, geralmente, ligadas às tradições de festas católicas que homenageiam Nossa Senhora.

Oficialmente, no Brasil, o dia de Iemanjá ocorre em 2 de fevereiro, mesma data de celebração da Festa de Iemanjá na cidade de Salvador. Lá, a comemoração está ligada ao Dia de Nossa Senhora das Candeias, também chamada da Candelária, da Luz e/ou da Purificação, complementa Jean dos Anjos. Em outras cidades brasileiras, o dia dedicado à orixá varia de acordo com a aparição de Nossa Senhora mais representativa.

“Em 15 de agosto, Iemanjá é celebrada em Fortaleza junto com Nossa Senhora da Assunção. A tradição da nossa festa foi trazida por Mãe Júlia Barbosa Condante do Rio de Janeiro, onde se celebra Iemanjá no dia de Nossa Senhora da Glória, padroeira daquela cidade”, detalha o antropólogo. ”Em 8 de dezembro, em Belém, no Recife e em outras cidades, Iemanjá é celebrada no mesmo dia de Nossa Senhora da Conceição”, salienta.

A Festa de Iemanjá é celebrada em Fortaleza desde 1950. Em 2017, o festejo foi registrado como patrimônio imaterial do Município. (Foto: Tatiana Fortes/ O POVO)

Em Belo Horizonte, Iemanjá também é celebrada no dia 15 de agosto, dia de Nossa Senhora da Boa Viagem. A comemoração é realizada na Lagoa da Pampulha. Segundo Jean dos Anjos, os calendários provocam o imaginário brasileiro das grandes mães. “Nossa Senhora é mãe de Deus, e Iemanjá é mãe de todos os Orixás. Geralmente, nos dias das padroeiras, é feriado nas cidades e a comunidade umbandista aproveita para celebrar Iemanjá”, destaca.

As festas públicas de Iemanjá são preparadas pela comunidade de terreiro para que todo o público possa receber as bênçãos do Orixá. Na data, os umbandistas prestam a homenagem, agradecendo realizações e reforçando pedidos por meio da entrega de oferendas. Em 2020, a festa de Fortaleza completa 55 anos de existência e resistência do Povo de Santo que a organiza, pontua o antropólogo. Em 2017, ela tornou-se Patrimônio Cultural Imaterial de Fortaleza.

Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção

O culto à padroeira da cidade de Fortaleza, Nossa Senhora da Assunção, começa com a chegada da imagem, em 1622, às margens do Rio Ceará. Com a expulsão dos holandeses em 1654, o forte, denominado Schoonenborch, passou a se chamar “Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção”, conta o antropólogo Jean dos Anjos. Já em 2003, deu-se início a Caminhada com Maria, como parte da programação do Jubileu de 150 anos da Diocese do Ceará.

FORTALEZA, CE, BRASIL, 15-08-2019: Caminhada de Maria. Procissão que sai da Igreja de nossa Senhora no bairro de Vila Velha e vai em direção à Catedral de Fortaleza em um percurso de 12km. (Foto: Júlio Caesar/O POVO) (Foto: JÚLIO CAESAR)

“O objetivo era rememorar as tradições cristãs de Fortaleza, que desde o século XVII tem registro da devoção à Nossa Senhora da Assunção”, destaca. O evento tornou-se patrimônio cultural imaterial do País desde 2015 e, este ano, será realizado virtualmente pela primeira vez, em razão da pandemia da Covid-19.

Tradição sincrética do catolicismo popular

O professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC), Christian Dennys, esclarece que as festividades de Iemanjá e Nossa Senhora da Assunção nasceram conjuntamente nos anos de 1950 – sem demarcação precisa por autores que se debruçaram nos eventos.

No entanto, enquanto a festa da padroeira de Fortaleza é paroquiana, a Festa de Iemanjá nasce de uma convenção de diferentes terreiros e associações de Umbanda, além de outras forças místicas da prática de Jurema, Catimbó, Terecô; e ainda do Candomblé. Esse último é mais conhecido por sua ascendência africana sem elementos indígenas, destaca o professor.

Segundo Christian, que é pesquisador de religião e doutor em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo (USP), essa convenção se transformou em um processo de sincretismo religioso incompleto. “Apesar de a Igreja Católica, na virada do século XXI, construir uma ligação com os festejos já tradicionais da Umbanda no litoral – Praias de Iracema e Futuro, principalmente -, acabou ignorando as marcas celebrativas dos grupos afros e desenhou uma procissão mariana desconectada e autônoma”, explica o professor.

Assim, as comemorações da Umbanda seriam associativas, vinda das bases populares dos praticantes do panteísmo espírita Umbandista, frisa Christian. Enquanto a tradição Arquidiocesana de homenagens à padroeira Nossa Senhora da Assunção só veio ganhar força recentemente. Primeiramente, em termos paroquianos. Depois, na tentativa de demonstrar a antiguidade da Fundação de Fortaleza no início do século XVII. E, por fim, na construção do Círio de Assunção, chamado de Caminhada com Maria.

Conforme Christian, um destaque importante entre as festividades é a devoção e homenagem ao protagonismo feminino, tanto no catolicismo quanto no panteísmo afro-ameríndio. “Esse destaque é pouco assinalado em termos simbólicos e espaciais; e, de forma paradoxal atrapalha, e muito, a explicação do fato de se observar o ‘apartheid’ sutil das duas Festas patrimoniais da Cidade de Fortaleza”, pontua.

Para o professor, se a Cidade fosse menos segregada e mais inclusiva, seria possível uma aliança entre as organizações religiosas, de forma a integrar os dois festejos. Sobretudo, na noite que antecede a data comemorativa. Porém, conforme o entendimento de Christian, ainda há discriminação entre organizadores e movimentos carismáticos católicos, que preferem manter a divisão de uma dupla homenagem.

“Quem sabe no tempo, no pós pandemia e no avanço de uma perspectiva patrimonial mais educativa e turística, o poder público leia a força dos dois festejos e ajude a conectá-los definitivamente na tradição da Cidade”, pondera o professor. Veja a programação religiosa da Festa de Iemanjá e Dia de Nossa Senhora da Assunção.

Fonte: O Povo

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