Ao ler sobre meu querido Mestre Francisco de Assis, descobri tantas coisas novas sobre ele, que vão além de tudo que já sabemos sobre sua vida desde Assis na Itália a partir de seu nascimento provavelmente em 1182, e na verdade muito tem a ver com o nosso Brasil de norte à sul. Continue lendo para conhecer mais sobre São Francisco de Assis na Umbanda.
Em 1982 foram comemorados os oito séculos do seu nascimento com lançamento de livros, um selo postal, salões de arte e celebrações religiosas. As três ordens, fundadas por ele, os franciscanos, as clarissas e a ordem terceira, manifestaram-se na ocasião.
São Francisco e seus frades estão muito presentes na história e na cultura popular.
Em Canindé (CE) está seu grande santuário que atrai anualmente muitos milhares de romeiros. Especialmente nas igrejas barrocas existem imagens bonitas do nosso santo, que é padroeiro dos escritores de cordel (desde 1975) e de todos os trovadores. A fé popular guarda histórias, rezas benditas e até pontos de Umbanda que falam de São Francisco. Umas quadras conhecidas:
São Francisco é meu Pai, Santo Antônio é meu irmão
Os anjos são meus parentes Ó que bela geração.
(Araçuaí. MG. 1979)
Viva São Francisco Com tanta grandeza
Retrato de Cristo É pai da pobreza.
(Salinas. MG. 1978)
Ó meu padre São Francisco Coluna da fortaleza
Assuspende o seu cordão Senão eu caio de fraqueza.
(Araçuaí. MG. 1977)
Ele está presente nos cantos de penitência na ocasião das secas. Também há quadras sobre ele nas folias de Reis e nos benditos da Semana Santa. São Francisco tem cantos de romaria e de simples devoção. Existem rezas que pedem sua ajuda para render e abençoar a comida, para amansar doidos e afugentar o demônio. Em alguns lugares é cantado o ofício popular de São Francisco (Conforme Cartilha da Doutrina Christã, de Antônio José de Mesquita Pimentel. Porto, 1871. pág.198ss.). Esta pequena introdução não mostra toda a riqueza da devoção popular para com São Francisco, mas é parte do contexto em que aparece o CORDÃO DE SÃO FRANCISCO.
- -(Artigo publicado na Santa Cruz. Nov/1982 e no Boletim da Comissão Mineira de Folclore. Ago/1986)
Mas neste conhecimento adquirido sobre Francisco de Assis, o que mais me chamou atenção foi descobrir que no início do século passado havia uma Linha de Umbanda que era chefiada pelo nosso São Chico, há registros em livros e inclusive conhecimento passado por pessoas mais antigas que conheceram os trabalhos de cura e de desobsessão nesta linha da Umbanda chamada de Linha Simiromba, que etimologicamente quer dizer Frade. Também conhecida como Linha dos Monges ou Linha de São Francisco de Assis. Nessa linha trabalham padres, freiras, monges e utilizam cânticos da Igreja e outras formas bem Católicas de trabalhar, misturados com uma mística medieval. Ainda existem Casas que trabalham com essa Linha, mas são bem poucas.
Esta linha de trabalho foi aos poucos desaparecendo das casas de Umbanda por motivos históricos, conforme relato abaixo:
É uma linha que se originou nas Macumbas Cariocas (As “macumbas” o que eram? mistura de catolicismo, feiticismo negro e crenças nativas – multiplicavam-se; tomou vulto a atividade remunerada do feiticeiro; o “trabalho feito” passou a ordem do dia, dando motivo a outro, para lhe destruir os efeitos maléficos; generalizaram-se os “despachos”, visando obter favores para uns e prejudicar terceiros; aves e animais eram sacrificados, com as mais diversas finalidades; exigiam-se objetos raros para homenagear entidades ou satisfazer elementos da baixo astral).
Conforme relatado no Livro Brasil Coração do Mundo Pátria do Evangelho, do Espírito Humberto de Campos psicografia do Chico Xavier, a Espiritualidade Maior já de olho em tudo que acontecia mandou seus emissários, para frear as maldades que estavam sendo feitas e com isso em 15 de novembro de 1908, Zélio de Moraes dá o pontapé inicial ao receber o Caboclo das Sete Encruzilhadas e fundar assim a Umbanda uma religião puramente nacional, que visava o bem, a cura, o intercâmbio mediúnico e o não sacrifício de animais. (Como a Umbanda não existia ainda por isso antes de Zélio, e existem relatos em um dos livros do Arthur Ramos e ou do Nina Rodrigues Mbanda ou Embanda (que posteriormente se transformou em Umbanda após e continuou pluralizada em vários tipos e formas de trabalhos).
Com o passar do tempo essa linha foi sendo deixada de lado e o que se encontra hoje são referências místicas e esotéricas como as do “Vale do Amanhecer” (Tia Neiva mentora física e hoje também espiritual), cabe aqui explicar que Francisco de Assis nesta linha de trabalho é conhecido como Pai Seta Branca, que é o líder da doutrina do Vale, e segundo Tia Neiva em uma das vidas passadas Francisco viveu como um indígena, próximo ao Lago Titicaca, entre o Peru e a Bolívia. Por isso a caracterização indígena e o nome Seta Branca, que também é conhecido como Simiromba de Deus ou Simiromba do Grande Oriente de Oxalá.
A Linha de Simiromba dentro do sincretismo afro-católico, seria uma Linha de Trabalho ligada a Oxalá (onde inclusive trabalham diversos outros santos da linha católica) e tida como cura, desobsessão, retirada de elementos negativos (por isso começaram a trabalhar na época das “macumbas”, pois os trabalhos de feitiçaria para o mal predominavam, e segundo relatos esta linha chefiada por São Francisco de Assis é exímia em trabalho de desmanchar magias negras, feitiçarias e desobsessões, além da cura.
O trabalho era feito com rezas, velas, incenso, e trajes característicos (hábito de monje e de freira), e tinha toda uma mística esotérica envolvida (talvez por isso começaram a atuar mais no Vale do Amanhecer). Creio particularmente que também isso se deu com a própria criação da Umbanda que através de outras linhas de trabalhadores como os Pretos Velhos, Exus, Erês (crianças) e os próprios Orixás e seus Falangeiros quando chegaram ao plano físico assumiram, digamos assim, a limpeza dos “trabalhos sujos”.
Uma realidade muito cruel de discriminação e preconceito, aconteceu com a institucionalização da Umbanda e na migração de muitos Espíritas para o meio Umbandista nos anos de 20, 30 e 40 do século XX, e que culminou também com a realização do Pacto Áureo, como forma de proteção ao Espiritismo Doutrinário.
Muitos Espíritas descontentes com a forma de trabalhar do Espiritismo Doutrinário ou Ortodoxo migraram para a Umbanda, dita como “Umbanda Branca” (juntando o trabalho de mesa com o trabalho de guias, como: Caboclos e Preto-Velhos) . Mas, ao mesmo tempo, houve uma discriminação de trabalhos que eram feitos antes da institucionalização da Umbanda, que eram feitos nas antigas Macumbas e que eram considerados como não evoluídos (isso atingiu a Linha de Simiromba e outras linhas tidas como Africanizadas).
Houve uma hipervalorização de duas formas de trabalho: a da Linha Branca Espiritismo de Umbanda (capitaneada por Zélio e por migrantes do Espiritismo Doutrinário ou Ortodoxa, e do Esoterismo que acabou encontrando lugar no que é conhecido como Umbanda Esotérica, a qual engloba várias vertentes, em que se destacou o trabalho de Betiol, Emanuel Zespo e WW da Matta e Silva).
Em 1941, com o Primeiro Congresso de Espiritismo de Umbanda (existe uma copia digital dos Anais desse Congresso no Site do Povo de Aruanda, se não me engano), foi intencionalmente criada uma barreira altamente preconceituosa aos cultos africanistas e outros que não estivessem dentro do contexto Espírita e Esotérico. Além de se colocar no Congresso a preocupação de dar a Umbanda uma origem que foi atribuída à Lemúria e a Atlântida.
Pelo lado do Espiritismo, para não haver uma miscigenação da Doutrina Espírita com a o Espiritismo de Umbanda, e outras seitas que pudessem poluir a Doutrina Espírita, foi criado em 1949 o Pacto Áureo. Esse Pacto frustrou os Espíritas Umbandistas de assumir a Umbanda como Espiritismo de Umbanda, pois muitas das pessoas que militavam na Umbanda Branca nessa época ou eram dissidentes do Espiritismo Ortodoxo, ou permaneciam em ambos (na Umbanda Branca ou Espiritismo de Umbanda e em Casas Espíritas).
Com a criação do Pacto Áureo essas pessoas tiveram que escolher onde iriam ficar: ou no Espiritismo Doutrinário ou no Espiritismo de Umbanda ou Umbanda Branca.
Os outros cultos de Umbanda acabaram se isolando e tentaram construir Federações que os abraçassem ou se retiraram do Rio de Janeiro para outros locais, como acabou acontecendo com a Linha de Simiromba, e algumas formas de Umbanda Omolokô que acabaram dando Origem em Florianópolis no Culto de Almas e Angola.
A partir de 1950 e por diversos aspectos de discórdias e brigas, a Linha de Umbanda Esotérica também acabou se isolando do Espiritismo de Umbanda que acabou retirando o nome Espiritismo e deixando apenas o de Umbanda Branca. E isso pode ser notado no Congresso de 1961, Segundo Congresso de Umbanda.
Existe muita história sobre a Umbanda em seus vários aspectos. É um motivo de também haver muitos preconceitos que foram sendo passados de geração à geração.
Só lembrando que existia e parece que ainda existe, mas bem pouco difundido, algumas casas de Umbanda que ainda trabalham com essa linha maravilhosa cujo Mentor ou Guia, ou Dirigente Espiritual é Francisco de Assis, este espírito que é pura luz, amor e abnegação e prá nossa felicidade, duas casas remanescentes estão aqui no Rio Grande do Sul, um dos “sacerdotes” responsáveis era um tenente reformado da Marinha e cujo centro chama-se Centro de Umbanda de São Francisco de Assis, hoje quem o dirige é a irmã deste tenente pois o mesmo faleceu, senhora Núbia Martha. O outro parece ter o nome de Casa de Oração São Benedito, cujo responsável é o Sr. Marcelino Antônio, nestes dois casos as fontes consultadas não lembravam as respectivas cidades.
A Umbanda de Simiromba tem a assistência de espíritos franciscanos, e seus trabalhos são muito bonitos, eles fazem muitas preces, novenas, suplicas faladas com protetores, dizem ainda que tem origens no estado do Maranhão.
À título ainda de conhecimento, cabe salientar que a primeira Tenda Umbandista fundada pelo Zélio de Moraes, a Tenda Nossa Senhora da Piedade trabalhava com essa linha de Simiromba, inclusive numa das incorporações do Caboclo das Sete Encruzilhadas, um médium vidente questionou o Caboclo Sete o porque dele falar como um caboclo, pois via que ele usava um hábito marrom de jesuíta, ao qual ele informou estar assim vestido de acordo com sua última encarnação na terra como padre jesuíta (e como nada é por acaso…)
Eram comuns naqueles tempos os centros de Umbanda que trabalhavam na linha de Simiromba, como era o caso da Cabana de Pai Caetano, fazerem a Oração de São Francisco na abertura das giras de Caboclos.
Era uma gira abençoada, conforme relatos de pessoas que conhecem esse trabalho.
Deixo abaixo, estrofes de pontos cantados nas sessões de Simiromba:
Simiromba vem Simiromba
Com a cruz na mão Simiromba
Como ele vem contente, Simiromba
Trazendo a sua redenção, Simiromba
Bate, bate, bate, bate, Simiromba
Ora tornas a bater, Simiromba
Para concluir tão belo conhecimento deixo depoimento de uma senhora do Rio de Janeiro, chamada Márcia e que faz parte do meio Umbandista e cujo depoimento sobre a Linha de Simiromba é impar:
Mãe Márcia D’Oya
Iniciei-me na Umbanda nos anos 60 e conheci pelo menos 4 centros aqui no Rio de Janeiro, que trabalhavam com a linha de Simiromba:
O primeiro era da Mãe Carmen, ficava no Encantado; o outro era da Mãe Guiomar Reis, no Sampaio, que foi quem me iniciou na Umbanda, chamado Casa da Vovó Maria Conga, terceiro era o terreiro de Mãe Dalila que ficava na Rua Barão dos Santos Anjos, no Engenho de Dentro, e ainda, a Cabana de Pai Caetano que era de meu avô carnal.
Na casa de meu avô, Pai Maurício, Simiromba era uma linha de trabalho chefiada por São Francisco de Assis. Eram freis e freiras que trabalhavam principalmente com cura. Eram invocados dentro da linha de São Sebastião (Oxossi).
Minha avó, Mãe Marina, trabalhava nesta linha com um Frei, que sempre fazia os casamentos da casa. Este frei, quando incorporado, durante estas cerimônias, transformava 2 pétalas de rosas brancas em hóstias que eram dadas aos noivos como se fosse uma comunhão. Vestia-se com uma túnica branca com uma cruz azul bordada no peito.
Ao ouvirem “Salve Simiromba”, os atabaques rufavam, se havia Caboclos em terra, estes se ajoelhavam para seus cânticos e assim permaneciam até que esta entidade chegasse.
Seu ponto de chamada era cantado lentamente:
Salve Simiromba!
Ê, Simiromba â.
Vem, vem, vem, Simiromba!
Simiromba, vem â Simiromba
Vem, vem, vem, Simiroba,
Ele vem com a cruz na mão, Simiromba.
Ê, Simiromba â¦
Vem, vem, vem, Simiromba!
Vem abençoar a gente, Simiromba
Ê, Simiromba!
Vem pelas mãos de Deus, Simiromba.
Ê Simiromba â¦.
Vem, vem, vem, Simiromba!
Lembro-me de mais um ponto que era cantado enquanto éramos abençoados:
Se meus olhos não me enganam,
É São Francisco, Simiromba â¦.
Me abençoa, meu Pai.
No raio do amor
No raio da Luz!
Se meus olhos não me enganam,
É São Francisco, Simiromba â¦
Me abençoa, meu Pai,
No amor de Maria com a sua cruz!
Para realizar esta pesquisa contei com pesquisas em livros e sites da Internet e da preciosa ajuda dos Irmãos do Grupo Povo de Aruanda, em conteúdos e depoimentos, são eles: Etiene Sales, Alex de Oxóssi, Pai Leo de Ogum e a nossa abnegada Mãe Márcia D’Oya.
Fonte: http://ametistadeluz.blogspot.com.br/2013/10/sao-francisco-de-assis-e-umbanda-de.html