Lenda de Iemanjá com Iansã que explica o ponto cantado

Exu foi chamado ao reino de Olokun, senhor dos mares, para um trabalho que somente ele poderia realizar. Ao chegar à sala do trono, ficou encantado ao conhecer Iemanjá, a filha do rei, que andava pelo salão a procura de uma jóia que tinha perdido. A beleza da moça era indescritível e Exu sentiu o ardor da paixão queimar-lhe o peito.

Saiu determinado a cumprir a missão e voltar o quanto antes para pedir a mão da princesa. Nunca ele fora tão rápido no cumprimento de uma tarefa quanto naquela. Em dois dias estava de volta, apresentando as provas do sucesso da empreitada. Olokun ficou contentíssimo e ofereceu ao rapaz grandes riquezas, mas este foi inflexível. A ele somente interessava casar-se com Iemanjá. O monarca ficou extremamente irritado com tamanha audácia e mandou que o colocassem para fora de seus domínios. Exu jurou vingança. Nunca ninguém o tinha tratado daquela forma e não engoliria a desfeita tão facilmente.

Durante semanas nada mais fez a não ser arquitetar um plano para raptar a princesa. Certa manhã, Iemanjá, com um imenso séquito, passeava pelas areias da praia, quando um imenso buraco se abriu a seus pés e a tragou para seu interior. Foi tudo tão rápido que ninguém pôde fazer nada. A fenda se fechou como se ali nada jamais houvesse acontecido. Os escravos desesperaram-se, como contar ao rei o sucedido? Certamente seriam mortos sem piedade. Não havia quem não conhecesse a fúria real. Pensando dessa forma todos fugiram e nunca mais apareceram para testemunhar o ocorrido. Enquanto isso, nas profundezas da terra, Exu desvelava-se em carinho e atenção para ganhar o amor de Iemanjá.

Desesperado com o sumiço da filha, o velho rei foi procurar um Babalaô que he contou exatamente o que tinha acontecido e o aconselhou a procurar por Iansã, jovem guerreira que nada temia e, por sua rara beleza, poderia granjear a simpatia de Exu. Iansã foi chamada e prontificou-se a buscar a jovem. Providenciou uma oferenda a Ifá, pedindo proteção e força, e partiu para o resgate.
Depois de muito andar, sentiu sob aos pés a quentura que denunciava a presença do sequestrador. Brandiu sua espada no ar, chamando os raios de seu domínio, e enfiou-a na terra com toda a força. Uma cratera se formou e a guerreira foi descendo lentamente. Logo avistou a bela moça sentada a um canto chorando copiosamente, a seu lado Exu afagava-lhe os longos cabelos fazendo juras de amor eterno.

– Vim buscar a princesa! – Seu tom de voz não deixava dúvidas, viera disposta a tudo.

– Como ousa invadir meu reino e ainda por cima ditar-me ordens? – Exu gritava descontrolado – Minha princesa daqui não sai! – Apontou para os pés de Iansã e um círculo de fogo se formou em torno dela, impedindo seu avanço.

– Não discutirei com você, peço a intercessão de Orunmilá, para cumprir a missão para a qual fui incumbida! Raios começaram a se espalhar por todo o espaço, uma ventania muito forte envolveu o corpo de Iansã, que assim chegou perto da moça que a tudo assistia perplexa. O homem foi jogado contra uma parede atingido pela violência do vento. Um redemoinho as envolveu transportando-as para o reino de Olokun.

O mar se abriu dando passagem para o pequeno tufão cavalgado por Iansã. Dos olhos do rei correram lágrimas de alegria e gratidão quando avistou em meio ao tormento o rosto da querida filha. Iemanjá e Iansã tornaram-se amigas pela eternidade. Exu ainda está no interior da terra, algumas vezes chora por uma e pragueja contra a outra. Hoje muitos terreiros cantam que em pleno mar havia duas ventarolas. É a essa história que se referem!

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