A Importância do Jogo de Cartas

Por Nádia de Iansã

O baralho cigano encanta, desvenda, traz respostas precisas e rápidas para os temas mais relevantes da nossa vida, provoca êxtase naqueles que o procuram; sua precisão permite com que as pessoas mudem rapidamente seus destinos, agindo de acordo com as revelações dadas pelas cartas; caso assim o desejem posto haver o livre arbítrio. Ele é um oráculo que estimula muito a capacidade intuitiva, por isso é bastante recomendado para assuntos práticos.

Quem vivencia a experiência do baralho cigano acaba se apaixonando por essa prática e se torna cliente fiel.

Ele tem uma forte ligação com o espírito do povo cigano, que não se prende a nenhum local, tendo assim uma leitura mais livre de influências terceiras, voltada somente às energias das cartas.

Um dos oráculos mais antigos e assertivos, o Baralho Cigano é capaz de se aprofundar no campo em que o consulente tiver interesse e tirar dele as respostas necessárias para sua orientação. Envolto em mistérios e sedução, esse baralho atrai atenções até mesmo dos mais descrentes.

De acordo com a tradição, o Baralho Cigano só poderá ser lido por mulheres, pois trazem em seu interior a energia da lua (o oculto), tendo a luz da vidência, o dom do sentir, pressentir e interpretar.

Para a leitura das cartas, a Cigana Esmeralda utiliza três baralhos:

  • CIGANO ( composto por 36 cartas e suas figuras têm significado psicológico e cósmico),
  • CÁRMICO (composto por 22 cartas – ARCANJOS – com o objetivo de desvendar os processos kármicos, conhecer e entender padrões de comportamento e na realidade perceber qual ou quais os caminhos a seguir para repor o equilíbrio nas linhas da vida),
  • MARIA PADILHA (composto por 36 cartas é um sistema divinatório baseado na entidade espiritual Dona Maria Padilha, e por ser um baralho de esquerda e de uma guardiã é extremamente objetivo e assertivo, desvendando o seu futuro).

A magia das cartas ciganas são pontuais ao abordarem um determinado tema, e também a profundidade com a qual analisa e identifica o que é solicitado pelo consulente.

Fonte: Templo Círculo da Paz

Pretos Velhos sob os Aspectos Históricos

Por Nádia de Iansã

As grandes metrópoles do período colonial: Portugal, Espanha, Inglaterra, França, etc.; subjugaram nações africanas, fazendo dos negros, mercadorias, objetos sem direitos ou alma.

Os negros africanos foram levados a diversas colônias espalhadas principalmente nas Américas e em plantações no Sul de Portugal e em serviços de casa na Inglaterra e França. Os traficantes coloniais utilizavam-se de diversas técnicas para poder arrematar os negros. Chegavam de assalto e prendiam os mais jovens e mais fortes da tribo, que viviam principalmente no litoral Oeste, no Centro-oeste, Nordeste e Sul da África.

Trocavam por mercadoria: espelhos, facas, bebidas, etc, os cativos de uma tribo que fora vencida em guerras tribais ou corrompiam os chefes da tribo financiando as guerras e fazendo dos vencidos, escravos.

No Brasil os escravos negros chegavam por Recife e Salvador, nos séculos XVI e XVII, e no Rio de Janeiro, no século XVIII.

Os primeiros grupos que vieram para essas regiões foram os bantos; cabindos; sudaneses; iorubás; geges; hauçá; minas e malês.

A valorização do tráfico negreiro, fonte da riqueza colonial, custou muito caro; em quatro séculos, do XV ao XIX, a África perdeu, entre escravizados e mortos 65 a 75 milhões de pessoas, e estas constituíam uma parte selecionada da população.

Arrancados de sua terra de origem, uma vida amarga e penosa esperava esses homens e mulheres na colônia: trabalho de sol a sol nas grandes fazendas de açúcar. Tanto esforço, que um africano aqui chegado durava, em média, de sete a dez anos. Em troca de seu trabalho os negros recebiam três “pês”: Pau, Pano e Pão. E reagiam a tantos tormentos suicidando-se, evitando a reprodução, assassinando feitores, capitães-do-mato e proprietários. Em seus cultos, os escravos resistiam, simbolicamente, à dominação. A “macumba” era, e ainda é, um ritual de liberdade, protesto e reação à opressão. As rezas, batucadas, danças e cantos eram maneiras de aliviar a asfixia da escravidão. A resistência também acontecia na fuga das fazendas e na formação dos quilombos, onde os negros tentaram reconstituir sua vida africana. Um dos maiores quilombos foi o Quilombo dos Palmares onde reinou Ganga Zumba ao lado de seu guerreiro Zumbi (protegido de Ogum).

Os negros que se adaptavam mais facilmente à nova situação recebiam tarefas mais especializadas, reprodutores, caldeireiro, carpinteiros, tocheiros, trabalhador na casa grande (escravos domésticos) e outros, ganharam alforria pelos seus senhores ou pelas leis do Sexagenário, do Ventre livre e, enfim, pela Lei Áurea.

A Legião de espíritos chamados “Preto-Velhos” foi formada no Brasil, devido a esse torpe comércio do tráfico de escravos arrebanhados da África.

Estes negros aos poucos conseguiram envelhecer e constituir mesmo de maneira precária uma união representativa da língua, culto aos Orixás e aos antepassados e tornaram-se um elemento de referência para os mais novos, refletindo os velhos costumes da Mãe África. Eles conseguiram preservar e até modificar, no sincretismo, sua cultura e sua religião.

Idosos mesmo, poucos vieram, já que os escravagistas preferiam os jovens e fortes, tanto para resistirem ao trabalho braçal como às exemplificações com o látego. Porém, foi esta minoria o compêndio no qual os incipientes puderam ler e aprender a ciência e sabedoria milenar de seus ancestrais, tais como o conhecimento e emprego de ervas, plantas, raízes, enfim, tudo aquilo que nos dá graciosamente a mãe natureza.

Mesmo contando com a religião, suas cerimônias, cânticos, esses moços logicamente não poderiam resistir à erosão que o grande mestre, o tempo, produz sobre o invólucro carnal, como todos os mortais. Mas a mente não envelhece, apenas amadurece.

Não podendo mais trabalhar duro de sol a sol, constituíram-se a nata da sociedade negra subjugada. Contudo, o peso dos anos é implacavelmente destruidor, como sempre acontece.

O ato final da peça que encarnamos no vale de lágrimas que é o planeta Terra é a morte. Mas eles voltaram. A sua missão não estava ainda cumprida. Precisavam evoluir gradualmente no plano espiritual. Muitos ainda, usando seu linguajar característico, praticando os sagrados rituais do culto, utilizados desde tempos imemoriais, manifestaram-se em indivíduos previamente selecionados de acordo com a sua ascendência (linhagem), costumes, tradições e cultura. Teriam que possuir a essência intrínseca da civilização que se aprimorou após incontáveis anos de vivência.

Pelintras e Padilhas: A dança dos corpos encantados

O escritor e historiador Luiz Antônio Simas explica neste texto a origem de entidades das macumbas brasileiras e sua articulação com as ruas – e por que elas desafiam uma sociedade fundada na lógica da contenção dos corpos.

O MALANDRO 

Entidade poderosa dos terreiros de canjira, baixando em diversos ramos e linhas das macumbas brasileiras, Zé Pelintra nos coloca desafios. Há quem afirme que, originalmente, Seu Zé é um mestre do culto do catimbó nordestino que acabou se manifestando em outras vertentes das encantarias.

O culto do catimbó é de difícil definição. Abrange um conjunto de atividades místicas que envolvem desde a pajelança indígena até elementos do catolicismo popular, com origem no Nordeste. Tem como seus fundamentos mais gerais a crença no poder da bebida sagrada da Jurema e no transe de possessão, em que os mestres trabalham tomando o corpo dos catimbozeiros.

Dizem os juremeiros que os mestres foram pessoas que, durante suas vidas, desenvolveram habilidades no uso de ervas curativas. Com a morte, passaram a habitar um dos reinos místicos do Juremá. Lá são auxiliados pelos Caboclos da Jurema, espíritos de indígenas que conhecem as artes da guerra e da cura.

O Juremá é um lugar composto de reinos, aldeias e cidades, como nosso mundo real. Há, dependendo da linha do catimbó, quem trabalhe com cinco ou sete reinos, formados por aldeias ou cidades e habitados pelos mestres. Para a linha de cinco, os reinos são os do Vajucá, Urubá, Josafá, Juremal e Tenemé. Para a linha de sete, temos os reinos de Vajucá, Juremal, Urubá, Tigre, Canindé, Josafá e Fundo do Mar. Os praticantes do culto consideram que Alhandra, no litoral Sul da Paraíba, é a cidade que representa os reinos do Juremá na Terra, onde os poderes dos mestres da Jurema teriam sido anunciados.

A Jurema, sem o acento agudo, é uma bebida tirada da árvore de mesmo nome, bastante utilizada nos ritos de pajelança dos tupis. É ela que dinamiza o catimbó e práticas similares, como o babaçuê e o toré.

Feitas essas breves observações sobre o catimbó, vamos a Seu Zé. Dizem muitas coisas e contam as mais mirabolantes e distintas histórias sobre certo José de Aguiar. Contam, por exemplo, que ele nasceu no Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, cresceu em Afogados da Ingazeira, outro município pernambucano, e posteriormente foi para o Recife, morando na Rua da Amargura, próximo à zona boêmia da cidade. Sofrendo de mal de amor, apaixonado perdidamente por Maria Luziara, Zé teria resolvido percorrer os sertões e praias do Nordeste para esquecer o infortúnio. Esteve na Paraíba e em Alagoas. Até hoje os terreiros cantam o desamor e sua sina:

“Na Rua da Amargura
Onde Seu Zé Pelintra morava
Ele chorava por uma mulher
Chorava por uma mulher que não lhe amava.”

Nessa peregrinação, ele teria sido iniciado nos ritos da Jurema sagrada por Mestre Inácio, por sua vez iniciado no culto pelos índios caetés. Após se encantar ou morrer (há controvérsias), Zé de Aguiar baixou um dia no juremeiro José Gomes da Silva e disse que era José Pelintra, Príncipe da Jurema e Mestre do Chapéu de Couro.

Quando baixa como entidade do catimbó nos terreiros nordestinos, Zé Pelintra é, portanto, um mestre. Com bengala e cachimbo, usa camisa comprida branca ou quadriculada e calça branca dobrada nas pernas, com um lenço vermelho no pescoço. Sempre trabalha descalço.

Ao chegar ao Rio de Janeiro, provavelmente trazido pelo traslado de inúmeros migrantes nordestinos atraídos para a cidade que, na primeira metade do século XX, era a capital federal, Seu Zé se transformou. Virou carioca e teve seu culto incorporado pela linha da malandragem na umbanda. Há quem diga que foi morar na Lapa, farreou à vontade e morreu numa briga no Morro de Santa Teresa. Abandonou as vestes de mestre da Jurema e agora baixa nos terreiros da Guanabara trajando terno de linho branco, sapato de cromo, chapéu panamá e gravata vermelha. Seu Zé se adaptou a essa nova circunstância. A viagem do Pelintra é até hoje retratada em um de seus pontos mais famosos:

“Ô Zé, quando vem de Alagoas
Toma cuidado com o balanço na canoa
Ô Zé, faça tudo que quiser
Só não maltrata o coração dessa mulher.”

A MOÇA

Zé Pelintra é a figura icônica do malandro nos terreiros do Brasil. Já a figura feminina que ocupa um lugar de protagonismo nas rodas da malandragem e nas giras dos exus é a pombagira. Se o Zé é o catimbozeiro que se fez malandro nas curimbas cariocas, quem são as moças formosas – maneira pela qual as pombagiras são conhecidas nas umbandas? Há que se raspar o fundo do tacho para, palidamente, acariciar os saberes que podem nos levar a elas.
Do ponto de vista da etimologia, a palavra pombagira certamente deriva dos cultos angolo-congoleses aos inquices. Uma das manifestações do poder das ruas nas culturas centro-africanas é o inquice Bombojiro, ou Bombojira, que para muitos estudiosos dos cultos bantos é o lado feminino de Aluvaiá, Mavambo, o dono das encruzilhadas, similar ao Exu iorubá e ao vodum Elegbara do povo fon. Em quimbundo, pambu-a-njila é a expressão que designa o cruzamento dos caminhos, as encruzilhadas.

Os cruzos religiosos entre as várias culturas de origens africanas, ritos ameríndios, tradições europeias, vertentes do catolicismo popular etc. dinamizaram no Brasil vasta gama de práticas religiosas fundamentadas em três aspectos básicos: a possibilidade de interação com ancestrais, encantados e espíritos através dos corpos em transes de incorporação (é o caso da umbanda) e expressão (é o caso dos candomblés); um modo de relacionamento com o real fundamentado na crença em uma energia vital – que reside em cada um, na coletividade, em objetos sagrados, alimentos, elementos da natureza, práticas rituais, na sacralização dos corpos pela dança, no diálogo dos corpos com o tambor; e na modelação de condutas estabelecidas pelo conjunto de relatos orais e pela transmissão de matrizes simbólicas por palavras, transes e sinais.

A pombagira é resultado do encontro entre a força vital do poder das ruas que se cruzam e a trajetória de encantadas ou espíritos de mulheres que viveram a rua de diversas maneiras (a corte das pombagiras é vasta), tiveram grandes amores e expressaram a energia vital através de uma sexualidade aflorada e potencialmente livre.

 

A energia pulsante dessas entidades cruzadas, como se o domínio delas já não fosse as encruzilhadas, é libertadora, mas nunca descontrolada. Ela é sempre controlada pela própria potência do poder feminino e se manifesta em uma marcante característica da entidade: a pombagira é senhora dos desejos do próprio corpo e manifesta isso em uma expressão corporal gingada, sedutora, sincopada, desafiadora do padrão normativo. A pombagira, como diz um antigo ponto de umbanda, é uma ventania que se encanta nos corpos:

“Naquela ventania, ô Ganga
Que sopra ao pé da serra
Vejo Maria Padilha, ô Ganga
Que vem girar na terra.”

PELINTRA ENCONTRA PADILHA

No carnaval de 2016, Zé Pelintra deixou os terreiros de macumba e ganhou a Marquês de Sapucaí, avenida onde as escolas de samba do Rio de Janeiro desfilam durante o Carnaval. Não precisou alterar as cores de sua vestimenta, já que a escola que o homenageou, o GRES Acadêmicos do Salgueiro, veste vermelho e branco, feito a gravata e o terno do malandro encantado. As pombagiras também tomaram conta do sambódromo.

O enredo da agremiação, “Ópera dos Malandros”, partia do musical de Chico Buarque de Hollanda para falar da malandragem. Nesse aspecto, trazia referências ao icônico Rio de Janeiro da década de 1930, território por excelência do “malandro histórico”, e referências ao “malandro divino”, cujo território de atuação é o terreiro de santo.

O enredo do Salgueiro causou celeuma, confirmada pelo desfile. Na frente da escola vinha Seu Tranca Rua, exu de umbandas e quimbandas, com sua desconcertante multiplicidade cruzada de quem cozinha a gambá na hora que quer. Atrás dele, a turma da guma, da curimba, da raspa do tacho, da beleza desconcertante e amedrontadora da rua, dos feitiços da Jurema, dos catimbós, das tabernas ibéricas e biroscas cariocas, daqueles que correram gira pelo Norte.

Dias antes do desfile oficial, a escola se apresentou em um ensaio geral na avenida. A rainha de bateria, Viviane Araújo, veio representando as pombagiras em sua performance. O fato gerou uma enxurrada de comentários preconceituosos nas redes sociais, especialmente de neopentecostais que acusaram Araújo de emprestar seu corpo ao diabo.

No dia do desfile, contrariando expectativas, a rainha de bateria não veio representando uma pombagira. Foi a vez de os adeptos das religiões afro-brasileiras acusarem o Salgueiro de ter recuado em virtude dos ataques evangélicos.
O fato é que o malandro batuqueiro e a dama da noite incomodaram de todas as formas. Para desamarrar o nó dessa polêmica, nos resta tentar responder à pergunta que o desfile salgueirense escancarou: quem tem medo de Seu Zé Pelintra e de Dona Maria Padilha?

A GIRA

As reflexões que o encontro entre Seu Zé Pelintra e as pombagiras sugerem, com toda a controvérsia provocada pelo desfile do Salgueiro, devem ser dimensionadas a partir de uma constatação: a exclusão social no Brasil é um projeto de Estado. A afirmação simples apenas constata que, com momentos raros de relativização desse processo, o Brasil foi um país que articulou estratégias em relação à pobreza, fundadas na experiência que é o maior marco da nossa formação: a escravidão. A dominação do outro se articulava em estratégias de controle dos corpos com inúmeras variantes: o corpo amansado pela catequese, pelo trabalho bruto, pela chibata e pelo confinamento em espaços precários – porões de navios negreiros, senzalas, canaviais e cadeias.

O fim da escravidão exigiu redefinições nas estratégias de controle dos corpos e coincidiu com os projetos modernizadores que buscaram estabelecer, a partir da segunda metade do século XIX, caminhos de inserção do Brasil entre os povos ditos civilizados. Tomo o Rio de Janeiro como horizonte dessas reflexões.

A relação das elites e do poder público com os pobres, dentro dessa aventura modernizadora, era paradoxal. Os “perigosos” maculavam, do ponto de vista da ocupação e reordenação do espaço urbano, o sonho da cidade moderna e cosmopolita. Ao mesmo tempo, falamos dos trabalhadores urbanos que sustentavam – ao realizar o trabalho braçal que as elites não cogitavam fazer – a viabilidade desse mesmo sonho: operários, empregadas domésticas, seguranças, porteiros, soldados, policiais, feirantes, jornaleiros, mecânicos, coveiros, floristas, caçadores de ratos, desentupidores de bueiros.

Novas e velhas estratégias de confinamento dos corpos então se articularam, agora em favelas, subúrbios, vagões lotados e cadeias. O ideal era que os pobres não estivessem nem tão perto, a ponto de macular a cidade restaurada e higienizada, e nem tão longe, a ponto de obrigar a madame a realizar os serviços domésticos que, poucas décadas antes, eram tarefas das mucamas de sinhá.

Aqui vem a questão que precisa ser levantada com mais clareza: o controle dos corpos se articula permanentemente ao projeto de desqualificação das camadas subalternas como agentes incessantes de invenção de modos de vida. Esse projeto de desqualificação da cultura atua em algumas frentes. Entre elas, vale citar a criminalização de batuques, sambas, macumbas, capoeiras; e a repressão aos elementos lúdicos do cotidiano dos pobres (o jogo do bicho – reprimido por ser, no início do século XX, uma loteria dos mais humildes – é exemplo disso).

Essa prevenção contra a pobreza articulou-se também no campo do discurso em que atua a história como espaço de produção de conhecimento. Apenas elementos externos aos pretos, indígenas e pobres em geral – a ciência, o cristianismo, a democracia representativa, a economia de mercado, a inclusão pelo consumo de bens, a escola ocidental etc. – poderiam inseri-los, ainda que precariamente e como subalternos, naquilo que imaginamos ser a história da humanidade.

Os corpos pelintras e pombagirados, nesse contexto, funcionam como antinomias ao projeto colonizador. Escapam da normatividade pelo transe, questionam em suas gingas e narrativas performáticas o estatuto canônico, levam ao limite da exasperação um projeto civilizatório que não consegue lidar com tamanha radicalização na alteridade.

A estranheza repulsiva que Seu Zé e Maria Padilha, Dona Molambo, Dona Sete Saias e tantas outras pombagiras causam revela, assim, desmantelando os velamentos cordatos, o pano de fundo da formação brasileira: o racismo de base colonial. É evidente que raça aqui não é o conceito biológico já superado. Penso, e não há novidade nisso, a raça como categoria política-social-cultural historicamente constituída, que continua atuando com vivacidade em nossas ruas, cadeias e cemitérios.

O racismo, nesse sentido, opera de três maneiras: na impressão mais direta da cor da pele; na desqualificação dos bens simbólicos daqueles a quem o colonialismo tenta submeter; e no trabalho cruel de liquidar a autoestima dos submetidos, fazendo com que introjetem a percepção da inferioridade de suas culturas. A discriminação, portanto, vai além do corpo físico (mas parte dele) e também se estabelece a partir da inferiorização de bens simbólicos daqueles a quem o colonialismo tenta submeter: crenças, danças, comidas, visões de mundo e formas de celebrar a vida, enterrar os mortos, educar as crianças etc.

O desfile do Salgueiro se localiza, portanto, no campo explicitamente oposto ao daquele em que os mecanismos coloniais atuam, ao trazer para o centro da perspectiva o catimbozeiro virado em malandro e as pombagiras de corpos ajustados, paradoxalmente, na lógica do desajuste normativo da experiência dos corpos livres. Zé Pelintra e as pombagiras, nesse sentido, não são sobreviventes. Nossa proposta é entendê-los a partir de outra categoria: a de supraviventes.

Valemo-nos, para definir a supravivência, da artimanha mandingueira das palavras, esticando a percepção da linguagem para o campo da poesia no qual o arrebatamento, inclusive conceitual, atua. Nossa hipótese é a de que somente a encantação da língua pode dar conta dos corpos malandreados no samba.

O projeto de normatização da vida pressupõe, para que seja bem-sucedido, estratégias de desencantamento do mundo e aprofundamento da colonização dos corpos. É o corpo, afinal, que sempre ameaçou, mais do que as palavras, de forma mais contundente, o projeto colonizador fundamentado na catequese, no trabalho forçado, na submissão da mulher e na preparação dos homens para a virilidade expressa na cultura do estupro e da violência: o corpo convertido, o corpo escravizado, o corpo domesticado e o corpo poderoso. Todos eles doentes. Nenhum deles corpos de pelintras e padilhas salgueirenses.

A colonização (pensada como fenômeno de longa duração, que está até hoje operando suas artimanhas) gera sobras viventes, gentes descartáveis que não se enquadram na lógica hipermercantilizada e normativa do sistema. Algumas sobras viventes conseguem virar sobreviventes. Outras, nem isso. Os sobreviventes podem se tornar supraviventes – aqueles que foram capazes de driblar a própria condição de exclusão (as sobras viventes), deixaram de ser apenas reativos ao outro (como sobreviventes) e foram além, inventando a vida como potência (supraviventes).

É na supravivência que o malandro divino e a dona das tabernas e encruzilhadas atuam. Eles trazem em seus corpos o grande signo da malandragem, a capacidade de se adaptar aos espaços do precário, e acabam subvertendo esses próprios espaços ao praticá-los como terreiros de saberes encantados, sacralizando o mundano e profanando o sagrado. São os corpos de pelintras e padilhas, em interação fantástica com seus cavalos de santo, que operam na mais radical oposição ao projeto colonial. São, por isso mesmo, talhados para o exercício sublime da liberdade. É como tal que incomodam, desafiam e, sobretudo, amedrontam os normatizados na lógica da contenção dos corpos ao insistir, gargalhando, na vida.

Laroiê!

*

Texto integrante do livro Cajubi: Ruptura e Reencanto (Editora Incompleta), que será lançado em março de 2021

Fonte: Piaui

Qual significado tem esta estratagema em nossas vidas ?

Alguns homens de hoje, mais e mais se caracterizam superficialmente pelas imagens, e se tornam distantes das rudimentares informações que as letras oferecem e lhes dão.

É a cultura ao aferir deste auto desleixe é modelo de preguiça, que assume, e que toma conta do ser humano que fazendo sumir a inspiração elevada, dá o lugar a conveniência empedrada das trocas dos favores; ante o assumir na sua personalidade a caricatura da imaginação cega e doentia que se afoga no lúdico do engodo e se droga na fascinação das incógnitas vis!

Pobre mentecapto! Que anda em duas pernas que só se diferencia dos outros seres vivos como os animais, por raciocinar, porém, não obstante se inferioriza por falta de discernir a si mesmo no amar e em amar naturalmente a si próprio com a propriedade que se diz ter de meramente pensar e raciocinar .

Reflexão em análise.

Eterno Aprendiz: Edson Rosa

Ano novo, velhos hábitos

Existem diversas superstições acerca da virada do ano. Tem gente que usa branco, tem gente que associa cores das roupas aos desejos e expectativas, tem gente que come lentilha, uva, romã, tem gente que pula 7 ondas, que joga alfazema e rosas brancas no mar. No Brasil, o que não nos faltam são crenças e ritos de passagem marcantes. Porém, o que muito já sabe, mas que se finge não saber, é que a maioria dessas crenças é oriunda das religiões afro-brasileiras. Todo mundo ama falar do mar de Yemanjá e saudá-la como Rainha e figura mais importante do sincretismo existente entre as religiões cristãs e afro. Todo mundo é batizado na Igreja, mas tem uma seiva de alfazema no banheiro de casa, que é utilizada para atrair bons fluidos, boas energias e prosperidade, além de associar o banho de mar à limpeza espiritual, principalmente na passagem do ano.

Parte dessas crenças vem da Umbanda e Candomblé, em que na década de 70, rituais eram vistos na última noite do ano nas praias do litoral do Rio de Janeiro, e os membros dessas religiões vestiam branco, cor que é remetida à herança do período da escravidão. Na época dos grandes engenhos e plantações, as roupas utilizadas pelas pessoas escravizadas eram as mesmas utilizadas em seus rituais religiosos, ou seja, os turbantes brancos, as saias rodadas brancas, as calças, mesmas vestes nos trabalhos da Casa Grande. Isso foi se adequando e sendo ressignificado ao longo do tempo, mas a cor branca também tem essa relação de acessibilidade ao que era possível ser feito na época, visto que todos os rituais tiveram que sofrer adaptações e resistir às proibições e desumanidades feitas pela sociedade escravocrata.

Os sete pedidos e sete ondas relacionam-se também à Umbanda, religião que possui 7 linhas de trabalho ligadas às divindades e entidades cultuadas, e para cada uva comida ou onda pulada, há o pedido a cada uma dessas sete linhas. Ou seja, seria mais fácil se o sincretismo atuasse de maneira agregadora, porém, a nossa herança violenta não permite que ele seja ressignificado e repensado na sociedade como uma incorporação de hábitos culturais. A mesma pessoa que veste branco e faz pedidos à beira-mar, é a mesma que faz o sinal da cruz ao passar por uma encruzilhada com os ebós para Exu, ou que associa as religiões afro-brasileiras ao negativo, ruim, mau.

Quando eu falo que não conheço o santo católico A ou B, ou que não me interesso por determinadas orações católicas, ou quando afirmo que não irei batizar meu filho no catolicismo, sou alvo de muitas críticas, olhares, inclusive já ouvi que estava reproduzindo o preconceito que tanto me esforço para combater em relação à minha religião. A grande diferença nisso tudo é que a origem do batismo católico é a imposição, a destruição de inúmeras culturas, a ameaça à cidadania, e isso não é um exagero meu, isso é História. A diferença é que não expor apoio às religiões afro, quando se utilizam de tantos dos seus rituais, é ser conivente com a perpetuação da violência a essas religiões. Por que esses simpatizantes têm vergonha em dizer que já procurou uma cartomante, uma mãe de santo, que já tomou uma limpeza no Candomblé, que já fez ebó, mas não sentem vergonha em falar que são batizados numa Igreja cujo alicerce foi feito com escravidão, violência e estupro?

A crítica pela crítica, para mim, não constrói. A culpa não é do catolicismo, protestantismo, espiritismo etc. As religiões não devem ser culpadas pela conduta de seus religiosos, mas é necessário refletir em como, realmente, respeitar os caminhos e escolhas que não são suas.  O Candomblé e a Umbanda não são religiões fechadas e exclusivas a seus membros, mas, é necessário que essa rede de curiosos que acredita apoiar e ter afinidades com a religião, mesmo sem adentrar, de fato, em sua ritualística, assuma e saia em defesa nos momentos em que o silêncio ecoa diante de uma agressão a essas manifestações religiosas.

Lembrem-se que o silêncio é uma arma poderosa para o bem e para o mal. Silenciar diante de uma situação de injustiça, de violência, de descaso, é estar de acordo com o opressor. O medo da fala é o mesmo medo que mata todos os dias os sonhos, os corpos, é o medo que oprime, que cala e que destrói a coletividade, a diversidade em nossas vidas. Pensem nisso, construam novos hábitos a cada ano, e incorporem o sincretismo de maneira real, justa e colaborativa. O silêncio é ouro, mas é a atitude que necessita reluzir.

Axé!

Fonte: Infonet

Frei une catolicismo, umbanda e espiritismo em Teresina: “temos ajudado muita gente”

Há seis anos, em uma noite de sexta-feira, o Frei Waldemar, então morador do Convento de São Raimundo, localizado no bairro Piçarra, na zona Sul de Teresina, teve uma “revelação noturna”. Segundo o religioso, Jesus Cristo lhe conduziu até um terreno tomado por matagal no Povoado Tapuia, região rural Leste da capital, e disse que era lá o lugar onde ele tinha que desenvolver sua fé.

O Frei Waldemar deixou o ministério católico e resolveu atender ao pedido espiritual:  fundou o Centro Ecumênico Divino Consolador. “Foi muito lindo esse momento, maravilhoso e não tive mais dúvidas quando meu mestre revelou isso. Eu respondi que ia arregaçar as mangas e trabalhar”, conta. No dia seguinte da revelação, a proprietária do terreno no povoado Tapuia doou o pedaço de terra para o sacerdote.

Com problemas nas cordas vocais de tanto “pregar”, Frei Waldemar tinha 22 anos quando ingressou na Igreja Católica.  Após três décadas, a necessidade de desenvolver suas atividades mediúnicas e de ajudar pessoas fez com ele decidisse trabalhar a unidade entre o catolicismo, a umbanda sagrada e o espiritismo kardecista.

Mestre em Sagradas Escrituras na FAI São Paulo, o Frei Waldemar morou dois anos em Jerusalém-Israel. Lecionou por mais de uma década nos Seminários Maior de São Luís e de Teresina como professor de Sagradas Escrituras e no curso de Ciências das Religiões.

“Na Igreja Católica eu estava trabalhando, me doando, mas estava havendo uma perseguição ideológica por parte dos confrades que não estavam entendendo minha missão espiritual.  Passei 30 anos na Igreja Católica como religioso franciscano, na ordem fundada por São Francisco, e devido à minha visão espiritual, visão teológica, eu vi que dentro da Igreja Católica, na teologia católica, não contempla tudo que se refere ao mundo espiritual, deixa muito a desejar.  Então, eu tendo essa necessidade, preferi deixar o ministério católico, não abandonar a fé católica, mas dar uma visão mais aberta introduzindo o viés da doutrina espírita e também da doutrina umbandista, trabalhando esse tripé teológico: católico, espírita e umbandista em unidade, numa visão ecumênica e de diálogo inter-religioso”, explica.

Cuidando do espírito

Filho de Oxalá, que na Igreja Católica é Jesus Cristo, o Frei Waldemar conta que o trabalho em unidade com guias da umbanda, mentores espirituais e santos católicos, tem ajudado muitas pessoas. Idosos, adultos, crianças, jovens, políticos, candidato a governador. Pessoas de todo Piauí, Ceará, Maranhão e São Paulo. São muitos os pedidos de atendimento com o Frei, que afirma que não cobra nada pelas “consultas”, mas recebe doações voluntárias para prover as despesas da casa.

“Sou filho de Oxalá, Jesus é o nosso mestre. Em segundo lugar, sou filho da mãe Imaculada Conceição, a quem eu tenho uma profunda devoção, depois São Francisco e São Sebastião, que são meus padrinhos espirituais. Ogum rompe matas tem trabalhado muito ultimamente comigo e a gente tem ajudado muita gente. Aqui é um centro cristão ecumênico que  trabalha a unidade entre a doutrina católica, os santos católicos descem aqui para trabalhar como os guias da umbanda e como os guias da doutrina espírita kardecista. A gente trabalha essa unidade para melhor servir ao povo de Deus”, afirma.

No Centro Ecumênico Divino Consolador o Frei Waldemar coordena as atividades de desenvolvimento mediúnico e ajuda espiritual.

O frei conta que a maioria das pessoas que busca atendimento no Centro Ecumênico Divino Consolador sofre com obsessões espirituais. Nas sextas-feiras e sábados são realizadas reuniões de cura, libertação e de desenvolvimento de médiuns.

“A demanda de gente necessitada é grande.  As maiores aflições são obsessões espirituais. As pessoas que têm o dom da mediunidade, mas não sabem trabalhar isso. Muitas vezes não sabem o que que é e terminam então adoecendo. Quando chegam aqui a gente começa a fazer o trabalho de desobsessão, vai retirando os espíritos, vai socorrendo e tudo isso é uma realidade muito grande. A pessoa vai se aliviando e fica bem. Já tratamos aqui várias pessoas”, disse. 

2021: ano da Esperança 

Frei Waldemar conta que São Francisco de Assis lhe revelou que 2020 seria um ano marcado por sofrimento. Mas, o sacerdote afirma que 2021 será o ano da esperança e que as coisas irão começar a melhorar a partir de maio.

“São Francisco me mostrou cenas de muito sofrimento, mas não me mostrava a causa  desse sofrimento. Por outro lado o próprio evangelho do nosso senhor Jesus Cristo já previa tudo isso, sinais dos fins do tempo no sentido tempo para iniciar outro tempo, um novo ciclo. Essa limpeza  passa tanto pela energia dos humanos, mas também própria natureza. Tem saído caro para humanidade porque a própria humanidade causou desmatamento, poluição e a consequência é tudo isso. Para 2021 sinaliza esperança de nova realidade e tempos novos, tempos melhores. Acredito que de maio em diante que as coisas vão começar a melhorar e a gente vai poder visualizar melhor esse novo tempo, novo ciclo que está acontecendo”, afirma.

Sobre a expectativa da vacina contra o coronavírus, o Frei ressalta que, conforme as pessoas forem se vacinando, elas sentirão mais segurança para poderem trabalhar, para poderem estar mais juntos, sorrir, brincar e se abraçar.

“Somos afetivos e precisamos disse,e ai vem a autoestima das pessoas que com certeza irá melhorar. O comércio, indústria, vai abrir mais as portas para postular mais emprego, tem muita gente desempregada, muita gente chorando”, analisa.

Novo templo
Com ajuda de doações, o Frei Waldemar está construindo um templo dentro do Centro Ecumênico Divino Consolador. No novo espaço terá salas de cura, de reunião e para atendimentos personalizados. A expectativa é que a obra termine neste próximo ano.

Izabella Pimentel
[email protected]

Fotos:Roberta Aline/Cidadeverde.com

Cidade Verde

Como os umbandistas encaram o Natal

Com influências católicas em sua fundamentação, os adeptos da umbanda, religião brasileira, comemoram o Natal, assim como os cristãos, pois creem na divindade de Jesus.

“Cultuamos e cremos em Jesus Cristo, que, na umbanda, é sincronizado como o orixá Oxalá. Portanto, comemoramos o Natal de forma ‘livre’, já que a religião permite a seu devoto tal liberdade”, fala Jefferson do Nascimento Nunes, 33, analista de sistemas e sacerdote de umbanda.

Segundo Nunes, no entanto, a religião tenta passar para os adeptos uma visão menos comercial desta data, trazendo ensinamentos que os encoraje a serem mais humildes, gratos, fraternos, unidos, caridosos, amorosos e verdadeiros.

“O objetivo é despertá-los para a comemoração com paz e alegria, para que possam se reunir com amigos e parentes, em um espaço onde todos se considerem irmãos, filhos do Deus único, que é Pai e Mãe, e é chamado pelos umbandistas de Olorum ou Zambi”, explica Nunes. O sacerdote ressalta, no entanto, que todos esses sentidos são trabalhados ininterruptamente pelos umbandistas independente do período do ano.

Alexandre Cumino, diretor da AUEESP (Associação Umbandistas e Espiritualista do Estado de São Paulo) e sacerdote, conta que, na ocasião, troca presentes e comemora o nascimento de Cristo com a família. “Como a umbanda não tem um ritual específico natalino, cada umbandista se reúne com sua família e comemora da maneira que achar melhor”, explica.

“Claro que temos a consciência de que a figura do Papai Noel é comercial, mas essa data, antes de tudo, é o nascimento de Cristo, por isso, é repleta de fé, paz e esperança”, explica.

Nunes conta que, como umbandista, se sente livre para comemorar o Natal com o ritual religioso que lhe for mais conveniente. “Faço rituais simples, como defumações, cantos e danças, até comemorações com amigos e familiares em festas onde os sentidos da fé, do amor, do equilíbrio, da saúde, da vida e da prosperidade são renovados e compartilhados por quem estiver ao redor”, conta.

Na mesma data do Natal, não existe outra comemoração na umbanda. No entanto, algumas vertentes ensinam seus seguidores/adeptos a comemorar o Dia de Oxalá, que, como já mencionado, é o Orixá sincretizado nos mistérios de Jesus Cristo.

“Não significa que Jesus e Oxalá sejam os mesmos ‘seres’, porém, emanam as mesmas energias e mistérios, o que, de certa forma, denota a mesma comemoração”, explica Nunes.

Fonte: Yahoo

Umbanda: Um ato de resistência da espiritualidade!

O 15 de novembro é o Dia Nacional da Umbanda, a data que o Caboclo da Sete Encruzilhadas desceu em terra no corpo do médium Zélio Fernandino de Moraes, em 1908. Ali, naquele dia, foi traçado como seria a religião Umbanda. O que era, qual forma de trabalho e como seriam dessa nova religião chamada de UMBANDA.

Porém, muito antes disso acontecer, pelos bairro do Rio de Janeiro, já existiam as famosas “macumbas cariocas”. Caboclos, pretos velhos, já desciam ali, em terra para dar suas consultas e seus passes. Dentro de centros espíritas kardecistas essas entidades eram mal vistas, sendo expulsas e não podendo mostrar seu conhecimento diante da espiritualidade. Apenas médicos, advogados, freis e etc, com um português corretíssimo poderiam descer em suas sessões.

O preconceito com quem “sabia menos” era explícito, mesmo dentro da espiritualidade. Foi necessário que, naquele dia um espírito plasmado “para quem tivesse olhos para ver”, viesse em um frei. A voz veio com um português “errado” e ali mesmo foi mostrado que quem estava presente era o espírito de um caboclo, um índio natural dessa terra que chamamos de Brasil! Provavelmente foi morto no genocídio indígena que houve nessa terra em que eles são os verdadeiros donos!

Caboclo das Sete Encruzilhadas: onde não existe caminhos fechados para onde ele possa caminhar. Esse espírito era um ato de resistência e disse à todos daquele centro espírita:

“Com os que sabem mais, aprenderemos.

Aos que sabem menos, ensinaremos.

Mas a ninguém viraremos as costas!”

Assim a Umbanda nasceu e é uma religião de resistência! Pretos Velhos, crianças, índios, mulheres, baianos e outras entidades são aceitas. Uma religião que tem a macumba carioca, o culto à Jurema, a encantaria brasileira, o ato do benzimento, o culto ao orixá. Mostra a sua força uma religião que não pode se calar!

O preto velho que veio à força e arrancado de seu país, tem história! E uma história muito antes de 1908. A cura com ervas e com rezos.

O índio, famoso caboclo tem a sua história quase apagada. Eles que são os verdadeiros donos de nossa terra e que trabalham com seus bate folhas.

Cada um com sua magia, do caboclo ao Exu.

A Umbanda já tem história, antes de entrar na história.

A Umbanda é a religião que mais agrega e não pode ser silenciada.

Parabéns a nossa amada religião que desde sempre mostrou força e resistência. Seja no Brado do caboclo ou ao enfrentar o elitismo de uma religião que só aceitava doutores.

A umbanda nos faz aprender com crianças, na sua risada, doçura e ternura.

A Umbanda sempre foi e sempre será uma religião de resistência, amor, carinho e compaixão!

Viva a Umbanda! Viva a macumba carioca!!

TEXTO: Diego Agassi | Terapeuta Holístico, Oraculista e Sacerdote de Umbanda

Erês: conheça as crianças que trazem alegria aos terreiros

Um modo de ver diferente, uma energia incontrolável, a mais pura e verdadeira vontade de ser feliz e de simplesmente viver o que tiver que ser vivido. São por meio dessas emoções e da simplicidade do olhar de uma criança, que despertam os erês. Brincadeiras e diversão são o significado da palavra erê em yorubá e traduzem muito bem o espirito de uma criança.

De acordo com a mística e espiritualista Kélida, esses seres iluminados trabalham como um intermediário do orixá, expressando sua vontade. Porém, para saber o que é o Erê de fato, é importante entender que existem diferenças entre a sua atuação na Umbanda e no Candomblé. “Na Umbanda acredita-se que que erês são espíritos de crianças evoluídas que não chegaram a encarnar e que estão muito próximas dos orixás, transmitindo suas sabedorias. Já no Candomblé, eles são vistos como entidades intermediárias que conectam o orixá ao seu filho ou filha, em rituais de iniciação”, explica.

A especialista, que também é umbandista e criadora de um dos principais canais do Youtube sobre espiritualidade, destaca que, apesar da festa e da alegria contagiante, esses seres encantados aparecem para equilibrar a energia do local e transmitir a mensagem do orixá regente. “Eles podem, de forma muito pura falar a verdade sem rodeios e fazer perguntas inapropriadas, típico de uma criança inocente”, pontua Kélida.

Dessa maneira, os erês simbolizam a ponte que o une o inconsciente do orixá e a consciência humana. “Eles são portadores de renovação, transformação, esperança e amor puro. A sua importância tanto para a Umbanda, quanto para o Candomblé é inegável, por isso, a sua presença no terreiro é sempre celebrada com muita festa”.

E por falar em festa, a celebração aos erês ocorre no dia de São Cosme e Damião, os famosos santos gêmeos da Igreja Católica. Os dois eram médicos que costumavam atender a população carente gratuitamente e, quando os pacientes eram crianças, entregavam doces.

Kélida, que também é Dirigente na Casa Espiritual Maria Madalena, explica ainda que a representatividade no seu trabalho com os erês vem na forma de uma criança – um espirito que atende pelo nome de Helena, carinhosamente chamada de Heleninha. “Esse espirito infantil atua realizando trabalhos mediúnicos de cura mental e física e seus trabalhos a distância atraem cerca de 3.500 pessoas em uma sessão de uma hora e meia.”

A especialista revela ainda que em seu trabalho como mística e espiritualista recebe pedidos de pessoas do Brasil e do Exterior e assim consegue arrecadar cestas básicas, roupas e brinquedos usados para ajudar instituições de caridade através da ajuda dos erês. “Crianças significam alegria, vida, continuidade e fé e por esse motivo estamos sempre em constante crescimento e aprendizado com essa energia pura e cheia de amor” – finaliza.

Fonte: Bonde

Mais um dia invisível

Começa mais um dia como outro qualquer. Meu dia a dia é sair andando por ai e ser ignorado por todos. É curioso como desviam olhares ao me ver ou simplesmente mudam de caminho para passar mais distante. 

Observo cada detalhe ao meu redor, a moça com roupa da academia ouvindo música nos fones de ouvidos para se desligar do mundo externo, o porteiro do prédio com um sorriso dando bom dia ao morador sendo ignorado, o policial fazendo ronda com sono do trabalho dobrado para complementar a renda sendo ridicularizado por fazer seu trabalho. E cada vez vejo uma coisa em comum em cada observação, pessoas ignorando e menosprezando as outras. 

Nos meus tempos de mais jovem, lembro que era normal o olhar com um sorriso desejando um bom dia, os jovens dando preferência aos idosos com uma boa vontade, até o simples olhar da criança observando um pássaro cantando na praça. O mundo mudou bastante.

Volto ao fim do dia para meu canto e fico pensando, quem mundo é esse que nos aguarda, onde as pessoas só pensam nelas e ignoram os outros?

Apoio:

Manual Básico de Linguistica Forense

Morro de Saudades – Os quatro caminhos para o Morro do Castelo

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